10 maio 2006

Poema debaixo da Terra

Ela tinha o corpo velho curvado. Levava um saco que era demasiado pesado para os ossos frágeis que se adivinhavam debaixo da pele turva e amarela. As veias marcavam os braços magros com figuras abstratas de um verde-morte. Ele tinha o cabelo despenteado, traquina, e faltava-lhe um dente. Enquanto esperávamos, não se calou um segundo. Falava com as mãos, com o corpo franzino, com a alma colada aos gestos que a hipnotizavam. E aquele rosto anónimo já em decomposição ganhava vida. Um ligeiro brilho, um último brilho talvez, iluminava os olhos claros cada vez que ele, docemente, lhe tocava e lhe chamava Avó.
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